As cem linguagens da crianças
- Silvia Pandini

- 14 de out.
- 3 min de leitura
Por Silvia Pandini

“A criança é feita de cem.
A criança tem cem mãos cem pensamentos
cem modos de pensar de jogar e de falar.
Cem sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar.
Cem alegrias para cantar e compreender.
Cem mundos para descobrir.
Cem mundos para inventar.
Cem mundos para sonhar.
A criança tem cem linguagens (e depois cem cem cem) mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura lhe separam a cabeça do corpo.
Dizem-lhe: de pensar sem as mãos
de fazer sem a cabeça
de escutar e de não falar
de compreender sem alegrias
de amar e de maravilhar-se só na Páscoa e no Natal.
Dizem-lhe: de descobrir um mundo que já existe
e de cem roubaram-lhe noventa e nove.
Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho
a realidade e a fantasia
a ciência e a imaginação
o céu e a terra
a razão e o sonho
são coisas que não estão juntas.
Dizem-lhe enfim: que as cem não existem.
A criança diz: ao contrário, as cem existem.”
Malaguzzi (1997). As Cem Linguagens da Criança. Porto Alegre.
Loris Malaguzzi criou a metáfora das Cem Linguagens para nomear a incrível capacidade humana de criar signos, códigos e símbolos para produzir linguagens que nos ajudem a expressar o mundo, a nós mesmos e àquela perplexidade que nos espanta no ordinário cotidiano.
Contrariando uma escola baseada na disciplina, no pensamento divergente, no treino enfadonho, no embotamento da alma e dos sentidos, Malaguzzi preconizou uma escola viva, pulsante e, em suas palavras, “amável”.
Produzir uma escola amável, à altura dos sentimentos e pensamentos das crianças, pressupõe a ação de muitos adultos trabalhando de maneira cooperativa e profundamente sintonizados aos modos de crianças,desde bebês, se perguntarem sobre si mesmo e sobre o mundo.
Para expressarem o que lhes vai na mente e nos sentidos, as pessoas, desde crianças acionam muitas linguagens: o choro, o gesto, os movimentos, a palavra oral, falada e escrita, o desenho, a pintura, a escultura, as construções com materiais não-estruturados, a argila, a natureza, a digital, o pensamento computacional, o brincar, o teatro, a comida… são tantas as possibilidades de linguagem que a lista parece não ter fim.
A atmosfera do Ateliê, que deve contagiar toda escola, é propícia para fomentar o pensamento divergente e os processos de aprendizagens por meio de distintas linguagens. Entendemos, portanto, que as diferentes linguagens produzem novos conhecimentos e que, à medida que crianças as acionam e as colocam em relação novas conexões se criam, nutrindo também a criatividade.
Nas palavras de Claudia Giudici, “Quando falamos de linguagem, referimo-nos aos diversos modos da criança (do ser humano) de representar, comunicar, expressar o pensamento por meio de diversas mídias e sistemas simbólicos; as linguagens, portanto, são as múltiplas fontes/gêneses do conhecimento.” As linguagens já existentes, e as muitas que ainda haveremos de criar, nos ajudam a viabilizar o pensamento de Véa Vecchi, e fazer da escola o palco de uma “dança entre cognitivo, expressivo, racional e imaginativo aconteça, ou pelo menos esteja o mais presente possível nos processos de aprendizagem.”
Romper as barreiras entre os sentidos e os pensamentos, integrar o corpo e a mente, acolher estilos cognitivos distintos, promover rotas autorais de pensamento, dar vazão às autorias das crianças, são as grandes contribuições que as múltiplas linguagens podem trazer para a escola e que as crianças levarão para consigo, para viver o presente e para o tempo indistinto que viverão além dos espaços da escola!














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